Mario Geisse: um precursor da enologia brasileira

(conteúdo publicado na Revista Terroir Boccati Edição 03 – Primavera)

Compromisso com terroir específico, capaz de oferecer um alto nível de qualidade e consistência. Esse é o trabalho de Mario Geisse, o enólogo com maior número de premiações no Chile no séc. XXI e o visionário que vislumbrou o potencial da região de Pinto Bandeira-RS, para espumantes premiums.

PERFIL DE MARIO GEISSE:

Naturalidade: Ovalle – Chile

Formação: Enólogo Engenheiro Agrônomo

Atuação Profissional: Diretor Presidente e Enólogo da Vinícola Geisse (Brasil), Viña Geisse (Chile) e Diretor Técnico da Viña Casa Silva (Chile)

Mario Geisse nasceu em uma cidade localizada a 400 quilômetros ao norte de Santiago, em Ovalle, região cuja principais atividades são a agricultura e a mineração. Seu interesse pelo mundo do vinho começou cedo, aos 10 anos de idade, quando foi com sua família a uma pequena aldeia chamada Calebu, onde teve a oportunidade de ajudar a elaborar um vinho feito em tigelas de barro, junto a um senhor chamado Perico. Essa experiência ficou gravada em sua memória e que, somada ao seu interesse pela vida no campo, o direcionou à paixão pela agronomia e a especialização em viticultura e enologia.

“Foi a partir dessa oportunidade com o senhor Perico que descobri que podia elaborar algo com minhas próprias mãos, com pouquíssimos instrumentos além da matéria-prima. Algo que, depois de pronto, no momento de consumí-lo, era motivo para celebrar entre amigos e familiares. Isso me encantou”.

 Após terminar a educação primária, Mario Geisse foi morar em Santiago, onde cursou o ensino médio e após, a faculdade de agronomia pela Universidade Católica do Chile, onde teve sua tese final aprovada com distinção. No ano de 1970, conquistou o título de Enólogo Engenheiro Agrônomo.

Em 1971, entrou na INDAP (Instituto Nacional para o Desenvolvimento Agrícola) e, dois anos após, ganhou uma bolsa do governo dos EUA, na Universidade de Davis, na Califórnia. No seu retorno do solo americano, em março de 1974, começou a trabalhar com a família Rabat, viticultores importantes do Chile. Durante essa época, além da dedicação a elaboração de vinhos e espumantes, Mario Geisse também desenvolveu uma Destileria dedicada à produção de Pisco na região de Ovalle.

Em janeiro de 1976, foi contratado pela francesa Moët Chandon para dirigir um projeto da marca em solo brasileiro. Foi neste momento que Mario Geisse teve a oportunidade de realizar a primeira safra no Brasil, nas instalações de Garibaldi, com o lançamento do primeiro vinho espumante produzido pela Chandon Brasil. Após 12 temporadas na Chandon, decidiu se dedicar a um projeto pessoal na localidade de Pinto Bandeira e, nessa época começou a profissionalizar o vinho na região.

Mario Geisse já recebeu diversas premiações por seus trabalhos, dentre elas, o “Prêmio ao Mérito do Vinho”, que é a distinção mais importante que um enólogo agrônomo pode receber no Chile, sendo o mais jovem premiado até os dias de hoje. Também recebeu um prêmio atribuído pela Associação de Gastronomia, devido sua contribuição para a indústria do vinho chileno. No Brasil, recebeu o prêmio de Honra ao Mérito Vitivinícola, pelos aportes realizados na vitivinicultura do Brasil, concedido pela Associação Brasileira de Enólogos. Mario Geisse também foi agraciado com o prêmio de inovação tecnológica na agricultura pela SNA (Sociedade Nacional de Agricultura).

Foto: Arquivo Pessoal

A descoberta de Pinto Bandeira

Depois sua primeira safra na Chandon, Mario Geisse ficou surpreso com a qualidade dos vinhos base e a vocação natural da região. Foi aí que descobriu uma oportunidade única para produzir uvas de qualidade superior, especialmente para espumantes. Então, surgiu um desafio: precisava encontrar um lugar que tivesse condições ideais, como solos com ótima drenagem, a melhor altitude possível, boa exposição solar e bem ventilada. Ao se deparar com Pinto Bandeira, foi amor à primeira vista, e lá se instalou.

Cave Geisse: o surgimento da vinícola e a produção de espumantes

A Cave Geisse surgiu devido a uma conversa que Mario Geisse teve com um amigo argentino, Luis Catena: “Mario, se você sabe fazer espumante pelo método tradicional e agora já produz excelentes uvas Chardonnay e Pinot Noir, por que você não elabora algumas garrafas e assim desvenda todo o potencial que acredita que a região pode oferecer? ”. Essas palavras, relembradas pelo enólogo, foram o ponto de partida para o sucesso.

A vinícola Geisse, em Pinto Bandeira, produz vinhos espumantes somente pelo método tradicional, ou seja, a segunda fermentação na garrafa está comprometida com o seu terroir único. Além disso, a Cave Geisse produz apenas com uvas Chardonnay e Pinot Noir dos vinhedos demarcados na região de Pinto Bandeira. Todos os vinhos base são degustados às cegas pela equipe e, no vinhedo, as doenças e pragas são controladas utilizando técnicas de manejo sustentável, entre elas o Controle térmico de pragas (TPC), que permitem obter uvas totalmente livres de resíduos químicos.

Já os vinhos tranquilos são produzidos em sua vinícola no Chile, no Vale do Colchagua no Microterroir de Marchigue, também sob o conceito de ter um compromisso com um vinhedo de terroir específico, capaz de oferecer um alto nível de qualidade e consistência.

Potenciais dos espumantes brasileiros

Mario Geisse está absolutamente convencido de que os espumantes brasileiros tem alcançado uma qualidade que começa a ser reconhecida em todo o mundo e está apoiado tanto pelos críticos quanto pelas avaliações em concursos internacionais, onde seu trabalho é sempre destacado. O enólogo acredita que o Brasil vai ser cada vez mais reconhecido no cenário mundial e que conquistará cada vez mais novos mercados.

Há algum tempo, a Cave Geisse definiu que queria se tornar produtora de vinhos espumantes de excelência, aproveitando as condições especiais do terroir de Pinto Bandeira. Segundo Mario Geisse, naturalmente vão surgindo outros produtores demonstrando seus potenciais e que, seguindo filosofias semelhantes, vão ajudar a solidificar a imagem do espumante brasileiro. “Aqueles que entendam que o maior compromisso é a matéria-prima vão se destacar mais, ficando cada vez melhores”.

Ainda, conforme o enólogo, quando a maior parte dos produtores percebeu que o vinho que pode ser elaborado na região com nível de qualidade constante e competitividade internacional é o espumante, houve um salto de qualidade muito grande, uma atenção especial por parte dos enólogos e, sem dúvida, vem sendo acompanhado pela evolução do consumidor, que hoje passou a admirar e reconhecer as qualidades do espumante produzido na Serra Gaúcha.

A medida que os consumidores vão evoluindo no consumo de espumantes, naturalmente vão ficando mais exigentes e mais seguros daquilo que gostam e valorizam, sem preconceito. “Acredito que esta região vai futuramente ser uma das grandes especialistas em espumantes do Novo Mundo e será capaz de atender a demanda dos mais variados gostos e estilos de espumantes, bem como as diferentes ocasiões de consumo, desde os mais frescos até os mais estruturados e complexos”, diz Mario Geisse.

Além disso, o enólogo está entusiasmado por ver jovens que participam em diferentes áreas da indústria do vinho, trazendo novas ideias e vendo como as mulheres estão ganhando espaço neste mundo, pois isso abre um horizonte mais amplo para o vinho.

Foto: Arquivo Pessoal

Fatos mais marcantes

  •  Primeiro vinho elaborado aos 10 anos de idade;
  •  Safra do primeiro vinhedo que plantou sozinho em Pinto Bandeira;
  •  Elaboração do primeiro espumante;
  • O dia do nascimento dos seus filhos: Daniel, Ignacio, Rodrigo e Renata.

Personalidades do mundo do vinho que inspiraram Mario Geisse

  • Don Alejandro Hernandez –  Professor de enologia na universidade em que estudou no Chile.
  • Phillippe Coulon – Francês e diretor enológico da Moët Chandon na França.

“Com ambos não aprendi somente coisas técnicas, mas também aprendi a trabalhar de forma apaixonada”.

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