(conteúdo publicado na Revista Terroir Boccati Edição 05 – Outono)
Edegar Scortegagna, um dos mais reconhecidos enólogos brasileiros compartilha um pouco da sua história e seu vasto conhecimento no mundo da enologia.
Naturalidade Flores da Cunha – Rio Grande do Sul
Formação Enólogo e Sommelier Internacional – FISAR
Atuação Profissional Enólogo da Luiz Argenta Vinhos Finos, sócio fundador e professor da ConceptWine (escola profissional de vinhos) e professor de enologia dos cursos de Sommelier Internacional UCS-FISAR
Descendente de italianos, nascido em Flores da Cunha – RS, Edegar Scortegagna é um dos mais reconhecidos enólogos brasileiros. Sua família cultiva uva desde que seu bisavô chegou da Itália, em 1873 e, além de cultivar a videira, também elabora vinhos. Edegar cresceu em meio a tudo isso e foi assim, desde muito cedo em sua infância, que começou a se interessar pelo universo da enologia.
Na metade da década de 1990, ainda no colégio, seu gosto e facilidade em química lhe permitiram realizar diversos experimentos de fermentação. No final dos anos 90, iniciou seus estudos em Enologia, na cidade de Bento Gonçalves.
“Sempre me senti bem em meio aos vinhedos, vendo as uvas nascerem ano após ano e, na sequência, os vinhos, que são obras de arte sendo desenhadas”.
Segundo Edegar, havia uma pessoa, infelizmente já falecida, chamada Gioachino Dallago, que era um amigo da família e que todo ano vinha da Itália para visitá-los. Ele não trabalhava no mundo dos vinhos, mas vendo o crescimento do setor vitivinícola do Brasil sempre trazia ideias novas e pensamentos da Europa.
A vida de Edegar foi marcada por diversos acontecimentos, e um que permanece gravado em sua memória, ocorreu em 1998. O enólogo conta que ele e seu amigo Gustavo Brogliato fizeram em casa, experimentalmente, um espumante pelo método clássico com Chardonnay, Moscato e Isabel, uvas que eles tinham à disposição.
“Acredito que foi o primeiro método clássico de Flores da Cunha. O resultado foi experimentado no ano de 2000, tudo fermentou e o Chardonnay ficou muito bom, já o Moscato e Isabel estavam horríveis (risos) ”.
Edegar formou-se enólogo pela Universitá degli Studi di Trento – Instituto di San Michele All´Adige e Universitá degli Studi di Udine na Itália, onde passou cinco anos estudando e colaborando com grandes vinícolas italianas. Foi em Milão que Edegar conheceu o proprietário da Vinícola Luiz Argenta, o Sr. Deunir Argenta. “Somos da mesma cidade e nos conhecemos por acaso em Milão no ano de 2007 em uma feira de máquinas enológicas”, conta. A partir desse encontro, começaram a conversar e, um ano depois quando Edegar finalizou seus estudos na Itália, voltou e assumiu como enólogo na Luiz Argenta Vinhos Finos, onde atua até hoje.
“Por ser descendente de italianos, sempre tive vontade de estudar na Itália, que tem diferença pelo método de ensino, pela estrutura que as universidades oferecem aos alunos e pelo número de vinícolas abertas para você aprender dentro delas, colocando a ‘mão na massa’. ”
O vinho, o Brasil e o brasileiro
Os vinhos brasileiros já são reconhecidos internacionalmente por experts do setor como produtos de alta qualidade. Conforme Edegar, o real problema é interno, é fazer com que o consumidor brasileiro deixe de lado o preconceito e beba mais o que é nosso. De uma certa forma, agora precisamos que o consumidor acredite também nos vinhos brancos e tintos.
O Brasil começou a investir em tecnologia na viticultura e nas vinícolas no final dos anos 90, isso quer dizer que fazem aproximadamente 20 anos. “Somos muito novos e evoluímos neste período em uma velocidade muito grande”, afirma o enólogo.
“Tenho certeza que com toda a facilidade de hoje em relação à comunicação, todos os estudos sendo feito pelos órgãos de pesquisa e pelas próprias vinícolas, em pouco tempo cresceremos ainda mais, afinando tudo o que foi feito até hoje. ”
A Itália e toda a Europa têm um consumo por pessoa de pelo menos 20 vezes superior ao do Brasil. Do ponto de vista do enólogo, isso está ligado à cultura e não tem nada a ver com ser mais quente ou mais frio. O Brasil é muito novo, um país de mistura de raças e culturas. A Europa consome vinhos há milhares de anos, beber vinho faz parte da vida das pessoas.
O brasileiro também está evoluindo o paladar, é questão de tempo e mudança de cultura e hábitos. “Hoje a gente liga a televisão por assinatura e a qualquer horário existem mais de 10 programas de gastronomia ou vinhos, isso ajuda muito para esta mudança”, diz.
Edegar, que ministra o curso de sommelier há 8 anos, comenta que, da mesma forma que cresce a procura ou a curiosidade para pratos diferentes e o crescimento da boa gastronomia, também em paralelo aumenta o consumo e interesse pelo vinho. Os dois andam juntos. O vinho é o casamento perfeito com a gastronomia, não existe outra bebida que se adapte melhor.
Ainda, segundo o enólogo, quando se fala em vinhos ou se está em uma sala falando sobre vinhos, as pessoas se sentem todas iguais, ricos e pobres, jovens e velhos, homens e mulheres, profissionais ou somente apaixonados, todos estão na sala para aprender ao máximo sobre vinhos e o mundo ao redor. Percebe-se cada vez mais uma sede em aprender e conhecer mais e mais. “A parte mais engraçada, é que nunca vamos saber tudo, pois os vinhos evoluem e as novas safras vem chegando”, diz.
As dificuldades…
A maior dificuldade, que Edegar acredita ser também de outros enólogos, é depender do clima para produzir uvas de alta qualidade para poder elaborar os vinhos com mais tranquilidade e qualidade.
“Com mais ou menos intensidade, verifiquei essa preocupação em todos os lugares por onde passei ou colaborei em vinícolas (Itália, Alemanha, França, Espanha, EUA, Chile, Argentina e Brasil). Não podemos esquecer que o trabalho do enólogo começa no vinhedo. ”
Para Edegar, exceto por todos os problemas que enfrentam há muito tempo, como tributação e concorrência desleal com produtos importados que entram no mercado brasileiro seja por contrabando ou sem tributação por causa de acordos bilaterais, mais cedo ou mais tarde, superando estas dificuldades e trabalhando em igualdade, o setor vitivinícola brasileiro crescerá bastante, e inclusive o consumo de vinhos.
Gestão na ABE
A Associação Brasileira de Enologia colabora com a qualidade dos vinhos do Brasil há 42 anos. Edegar foi presidente da associação nos anos de 2017 e 2018 e atualmente faz parte ABE como diretor técnico.
Sobre sua gestão, o enólogo conta que, em primeiro lugar, deram continuidade ao que vinha sendo feito, como a Avaliação Nacional de Vinhos, Concurso Brasileiro do Espumante, Brasil Wine Challenger, dentre outros.
“O foco principal na gestão foi a atualização do enólogo proporcionando palestras, viagens e degustações técnicas para podermos aproximar o mundo vitivinícola dos nossos profissionais e desta forma incentivá-lo a fazer melhorias contínuas em suas vinícolas, consequentemente aumentando a qualidade dos vinhos do Brasil. Foram inúmeras palestras, seminários e eventos ligados aos temas pertinentes ao mundo dos vinhos. ”
ConceptWine
A ConceptWine surgiu no início de 2018, liderada por Edegar Scorteganha e André Mallmann, com o objetivo de fornecer cursos para agregar e incrementar a parte técnica e a visão enológica de todos os profissionais que já fizeram cursos de sommelier ou outros cursos ligados a vinhos, independente da associação ou grupo. O foco enológico principal é apresentar aos enófilos uma outra percepção sobre o vinho, a real visão do enólogo.
Até o momento oferecem quatro módulos independentes.
#RECADODOEDEGAR
O mundo dos vinhos é algo fantástico, uma vez que você entra não consegue mais sair, e vai querer aprender cada vez mais. Então procure, estude, leia, visite vinícolas no Brasil e em outros países, deguste diferentes vinhos e invista um pouco em cursos. Hoje no Brasil existem dezenas de instituições que oferecem os mais variados cursos para quem desejar aprofundar o seu conhecimento.
Para finalizar, gostaria de chamar a atenção dos consumidores de vinho para a qualidade crescente do vinho brasileiro, e pedir que deem um voto de confiança para que sejam consumidos mais vinhos nacionais. Hoje somos reconhecidos mundialmente pela qualidade de nossos vinhos, porém nós brasileiros não valorizamos isso.
Saúde e bons vinhos a todos.