Leandro Baena: o Choro da Videira e sua paixão por vinhos brasileiros

por Gabriela Rosseti

(conteúdo publicado na Revista Terroir Boccati Edição 09 – Outono)

NATURALIDADE

Com dupla cidadania, pai espanhol e mãe brasileira, nasceu na cidade de São Paulo-SP

FORMAÇÃO

Médico e Sommelier

ATUAÇÃO PROFISSIONAL

Médico, Sommelier e Digital Influencer

Quem disse que uma viagem não pode transformar a vida de alguém?

Foi em Portugal, no ano de 2016, que Leandro Baena viu seus planos mudarem. Seu hobby começou a se transformar em um trabalho diário e, com muita dedicação, o tornou conhecido como Choro da Videira.

Choro, como é chamado, é cirurgião vascular e amante de vinhos. Ele conta que, em sua viagem, foi conhecer vinícolas portuguesas. A primeira visitada, a Wine & Soul, foi a que mais lhe marcou. Ele foi recebido por um casal que o levou conhecer a estrutura do local, passaram o dia com ele e contaram sobre a história da vinícola.

Ao chegar no hotel, Choro se perguntou quem era aquele cara tão acessível que o recebeu? Para sua surpresa, era Jorge Serôdio Borges, um dos maiores enólogos da Europa. Choro gosta de compartilhar essa história pois, se ele tivesse sido tratado de uma forma esnobe e se Jorge e sua esposa, Sandra Tavares, não tivessem sido tão receptivos, possivelmente não estaríamos falando da personalidade Choro da Videira.

“Naquele dia, virei meu perfil do Instagram só para conteúdos relacionados ao vinho, e prometi para mim mesmo que seria sempre acessível para todo mundo, assim como Jorge foi comigo”, conta.

Médico há 20 anos, Choro diz que hoje a medicina ocupa somente 20% do seu tempo. Os outros 80% são dedicados ao vinho, não é à toa que, recentemente, foi convidado para levar o evento ViniBraExpo para São Paulo e também para ser embaixador do vinho brasileiro na feira de vinhos Wine South America.

Choro se fascina quando recebe em seu direct perguntas do tipo: qual a diferença de vinho branco e vinho tinto? Ele explica tudo direitinho: o vinho tinto se vinifica com a casca, já o vinho branco geralmente sem a casca. Então ele questiona para o autor da pergunta: você acha que eu posso fazer um vinho branco de uma uva tinta? A pessoa pensa e fala, se você tirar a casca, pode.

“Pronto, está feita a missão. Então, o que me encanta é a possibilidade de acolher todo mundo sem nenhum tipo de pré-julgamento. Pois é o que eu gostaria de ter recebido quando comecei a estudar e é isso que tento passar para pessoas”.

MAS, POR QUE

CHORO DA VIDEIRA?

Segundo Choro, quando estava estudando para se formar sommelier, aprendeu sobre o ciclo da videira. Para ela não crescer excessivamente e não crescer uma uva ralinha, é feita uma poda. Quando a videira volta a atividade, começa a sair seiva pelos ramos que foram cortados. Por isso do nome Choro da Videira. “Para mim ela chora de alegria, porque vai virar vinho”, enfatiza enquanto sorri.

A PAIXÃO POR VINHOS BRASILEIROS

Quando Choro se formou, começou a tomar vinhos vendidos em supermercados, que, em sua maioria, eram argentinos e chilenos, mas, algo lhe chamou atenção. Começou a ouvir de várias pessoas que o vinho brasileiro era muito ruim. “Ouvi de muita gente e de gente reconhecida no mundo do vinho”, diz. Inconformado, se perguntava: poxa mas tem mil vinícolas no Brasil, todo mundo produz vinho ruim? Será?

Foi a partir de então, que Choro começou a pesquisar sobre vinhos brasileiros. “Quando comecei a procurar, só encontrei três marcas: Salton, Miolo e Valduga. Tomei um vinho de cada uma delas e adorei os três”. Não sabendo se realmente eram bons ou se era seu gosto pessoal, Choro passou a colocar

esses vinhos em degustações às cegas, para pessoas que não tomavam vinho brasileiro, para ver qual seria o efeito. E adivinha? Eles foram muito bem, todos gostavam. Então, viu que não era gosto pessoal, o vinho era bom mesmo. Apesar de tomar vinho do mundo todo, o vinho brasileiro tornou-se sua grande paixão.

A BARREIRA ENFRENTADA PELO VINHO BRASILEIRO

Choro comenta que precisamos corrigir o que precisa ser corrigido, mas, principalmente, focar na parte positiva do vinho brasileiro, e que a gente está conseguindo, não com coitadismo, mas por qualidade. “Tem um caminho longo pela frente em relação ao vinho nacional, mas, em pouquíssimo tempo, o vinho brasileiro já alcançou o nível de excelência que poucos países alcançaram de maneira tão rápida”. Outra barreira que o vinho nacional enfrenta é a necessidade de uma mudança da cultura do vinho. “Se você vai para a Europa, todo mundo toma vinho nas refeições, mas entendo que isso vai levar tempo”. Choro, citou como exemplo, que uma pessoa paga mais por um vinho mediano francês ou espanhol, do que por um nacional top, com valor mais em conta. Infelizmente, o brasileiro tem muito preconceito com produtos que são daqui, por isso algumas marcas precisam lançar primeiro lá fora para obter reconhecimento e depois lançar no Brasil, e isso acontece muito com o vinho Além do preconceito, Choro acredita que a logística poderia melhorar. “A substituição tributária já caiu no Sul, já caiu em São Paulo, pode não ser muito, mas acho que é um começo promissor”, afirma. Choro também enfatiza que, conforme aumentar o consumo de vinho no Brasil, teremos muito mais forças para cobrar das autoridades um olhar para o vinho como um alimento e não como uma bebida alcoólica simplesmente.

INSPIRAÇÃO

São três enólogos que o acolheram de uma forma que, segundo ele, jamais vai conseguir agradecer. Jorge Serôdio, Felipe Bebber e Edegar Scortegagna. São pessoas que ele diz “incomodar” todo dia, mas que eles têm paciência, respondem com áudio, mandam texto. A paciência que tenho com todos os meus seguidores, eles têm comigo.

VINHO NÃO É STATUS

Muita gente não se aproxima do vinho por insegurança e por achar que precisa de muito conhecimento. Choro conta que, na primeira degustação técnica que participou, nem se mexia. Ele não olhava para o lado, com medo de que alguém percebesse que ele não sabia nada. Mas, rindo da situação, avisa: “não tem nenhum problema você não saber nada. Se tiver alguma pessoa que te olhe torto, por você saber pouco ou não saber nada sobre vinho, o problema não está em você, o problema está nela. Então deixa ela se resolver e vai ser feliz”. Segundo Choro, é fundamental para quem está nas redes sociais, para os enólogos, para todos que estão envolvidos com educação em vinho, perceberem que, em cima desse abismo existente entre conhecedores e não conhecedores de vinhos, é muito fácil de se construir uma ponte e todos precisam construir juntos. Ah, um recado de Choro: “quem está cavando mais esse abismo vai ficar para trás. Por que o mundo moderno de hoje não suporta mais esse tipo de atitude”. O vinho não é para elitizar, o vinho está aí para agregar, para unir as pessoas em um objetivo comum. O vinho une tribos diferentes. “Se você deixa a arrogância dominar, se você perde a humildade, todo seu trabalho, na minha opinião, perde o sentido e perde o valor”, afirma com convicção.

VINHO E GASTRONOMIA

Choro acredita que temos que tomar muito cuidado quando falamos de harmonização. Para ele, o mais importante da harmonização é descobrir as coisas que te agradam ou não. “Uma vez, recebi uma mensagem de um seguidor dizendo que ele adora o gosto metálico quando come sardinha e toma um vinho Tannat. Eu vou falar o que? Você está errado, não pode gostar? Não. Eu vou falar: ‘eu não curto, mas se você gosta, vai ser feliz meu amigo’”, conta aos risos. Harmonização é uma coisa legal, porque surge um terceiro sabor quando ela encaixa bem, mas ela não pode ser limitante para o consumo do vinho. “Pode não harmonizar perfeitamente com a comida, mas harmoniza com os bons momentos”, diz.

O CHORO EDUCADOR

Choro, além de estudioso, também ministra cursos. As pessoas que não tomam, ou estão começando, acham que precisam saber muito para poder tomar vinho. A página Choro da Videira cresceu nesse sentido, de poder dar as informações que ele teve dificuldade em encontrar quando começou. “Estamos começando agora, mas a minha ideia é ministrar curso para iniciantes de forma online, mesmo não sendo a forma mais ideal, pois temos uma vasta possibilidade de levar o vinho para lugares e pessoas que não tem contato ou oportunidade de um curso de vinho presencial.

Juntamente com a Lisiane Gouvea Toniolo, Choro prepara um evento, com workshop, palestra e degustação às cegas de vinhos brasileiros e importados para os convidados. No último evento foram nove rótulos e Choro conta entusiasmado que os vinhos nacionais ficaram na frente e cita como exemplo um Barolo, cuja garrafa custava R$650. O Barolo não foi o vencedor, perdeu para um rótulo da Família Bebber.

Choro conta que sua primeira grande ousadia foi quando começou a colocar champagne contra o espumante nacional, “mas eu coloquei às cegas, achavam que o espumante ia perder feio, mas foi muito pelo contrário.

Durante nossa conversa, Choro também relembrou de um dos acontecimentos mais impressionantes que lhe aconteceu, que foi a Avaliação Nacional de Vinhos. No evento, mil pessoas degustando juntas, 16 comentaristas, incluindo ele. “Foi uma emoção muito grande, é inexplicável. A ABE (Associação Brasileira de Enologia) faz um trabalho muito sério, o concurso é tecnicamente impecável e eles têm a cara nova do vinho brasileiro. São enólogos jovens, uma galera interessada, que percebeu que a rede social está mudando a relação das pessoas com o vinho”, conta entusiasmado.

“Quando você anuncia o resultado, a galera começa a voltar nas taças, há uma comoção geral, dizem que não é possível. É muito legal, quando você vê o rosto do pessoal. Degustação às cegas é muito honesta, você elimina o bebedor de rótulo. E tem muito bebedor de rótulo, às vezes o vinho mais caro fica em último lugar.”

O RÓTULO DO CHORO

Quando Choro alcançou 20 mil seguidores, foi convidado pela Enos para provar todos os vinhos da marca, para ver qual ele gostava mais “Provei, sem saber qual era, falei o que mais gostei. Daí eles pediram se eu topava assinar o vinho. Claro que topei. Daí surgiu o Reserva do Choro, que foi uma parceria com a Enos”, conta. Além disso, alguns vinhos serão lançados com a Lídio Carraro. Choro enfatiza que acompanha a produção e, como ele diz, dá pitaco nos vinhos que levam seu nome.

VINHO E SAÚDE

Com a visão de um profissional da área da saúde, Choro afirma que vinho faz bem, se consumido regularmente. O que se recomenda é uma taça por dia para a mulher, e duas taças para o homem, devido a proporção de água no corpo. O vinho possui resveratrol, benéfico para a circulação. Mas, segundo Choro, não é só isso que faz bem, é também o estilo de vida de quem toma vinho, pois elas costumam construir mais relações interpessoais e acabam tendo mais momentos felizes. “Isso traz benefícios diretos a longo prazo para a saúde. Isso falo como médico sem medo de errar”, afirma. Esse assunto também é abordado no projeto “Vinho e Saúde Experience”, que aconteceu em São Paulo, juntamente com Gabriel Raeli (sommelier) e Rosana Raeli (nutricionista). Conforme Choro, são mostrados trabalhos e artigos científicos que comprovam que o vinho faz bem e, esse ano, pretendem realizar o encontro novamente. Qualquer pessoa pode e, principalmente, deve perguntar. “Pergunta boba é aquela que a gente não faz”, enfatiza Choro.

E, PARA QUEM ESTÁ INICIANDO AGORA?

Para quem não toma vinho, ou toma vinho de mesa, a indicação de Choro é muito clara: um espumante moscatel. “Acho uma baita transição pra quem toma vinho doce ou toma cerveja e quer começar a migrar para o vinho. E o moscatel brasileiro pra mim é o melhor do mundo. Indico sem medo”. Alguma dúvida? Manda direct no Instagram que ele vai adorar responder!

@chorodavideira

Quer saber mais sobre o Choro da Videira? Confira o podcast aqui!

One Reply to “Leandro Baena: o Choro da Videira e sua paixão por vinhos brasileiros”

  1. Parabéns Leandro por apreciar e incentivar o vinho nacional.
    Sou tomador assíduo de vinhos a mais de 50 anos, e portanto não sou tomador de
    rótulos ou vinhos sofisticados. Tomo como hábito mesmo já orientado por meu pai
    desde pequeno. Sempre tomei chilenos e nacionais, mas gosto de California, Italia,
    França, Australia etc.
    Na categoria dos brancos, espumantes e rosês dificilmente tomo outro vinho que
    não seja o nacional. Temos ótimos tintos também mas nosso clima favorece o branco.
    Tomo nacional não por nacionalismo mas pela qualidade mesmo, temos verdadeiras
    preciosidades. Sempre é um vinho novo e correto e se conhece a procedência.
    Na verdade cada vez mais vejo tomadores de nacional com convicção, parece que o
    tomador novo por insegurança é que é preconceituoso. O vinho importado barato é
    uma temeridade, já vem muitas vezes passado e não há preocupação com a qualidade.
    No Riode Janeiro tem uma casa de vinhos e restaurante que só trabalha com vinhos
    nacionais e tem uma seleção incrível (por região inclusive) é a Cave Nacional no Botafogo.
    Uma visita as regiões produtoras do sul é um espetáculo, completamente autentica, com
    gerações estabelecidas no mesmo local a 150 anos.
    Um abraço e parabéns
    Mário

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